o céu partido ao meio, no meio da tarde.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

amor, ódio, vazio

- Você me ama? perguntou ele.

(nosso sexo nunca foi sexo. fazia aquilo tudo pelo simples fato de fazer, pelo fato de venerar o entrosamento entre os corpos, entre os pêlos, entre os órgãos, entre a tua barriga magro-definida e a minha branca, de clarear os olhos. tua mão segurando firme o meu, já não dizia nada, e o teu pau rijo, severo e violento já nem me endurecia os mamilos. e eu que te sonhei por dias adentro, sonhei com os olhos bem abertos pois já nem conseguia mais dormir. te sonhei em minha janela, enquanto a lua beijava meu cigarro aceso, até o sol apagá-lo, disputando fervorosamente com a brasa de outros vários cigarros acendidos, um-atrás-do-outro. o pior do amar é o amar distante. te amo tanto quando estás longe que, ao te aproximares, meu amor não percorre, mas também não vira ódio: vira nada. vira falta de amor. vira vazio. hoje, já não quero mais desenhá-lo com a língua. quero mesmo é cuspir-te da minha boca: você e esse seu gostinho, impregnado no meu, confundido no meu travesseiro, impresso e exalando em minha pele. sinceramente, quero mesmo é que te deites ao meu lado, sem vontade alguma, sem qualquer contato físico-carnal, sem qualquer desejo, deixando-me incólume da vontade de querer-te que, apesar de, ainda pinga, esperando vazar a tua última gota que transborda em mim. eu sequer me entendo, para te entender ou compreender esse amor-ódio-vazio que tenho por ti.)

- Te amo, mas não conseguiria definir esse meu amor. Esquece o amor e me abraça? Mas não abraça meu corpo, e sim minh'alma.

se abraçaram então desde aquele dia friozinho de agosto, e se dissiparam por ai até o infinito, onde agora podiam ser estrelas, uma olhando para outra, uma piscando para a outra, uma frente-a-frente com a outra, sem a menor aproximação.

F;

13 comentários:

Não importa disse...

Quanta coisa passa pela nossa cabeça antes de respondermos uma pergunta, não? Ainda mais uma pergunta difícil... Amar é foda, ainda mais qdo é tão complexo como um amor-ódio-vazio inexplicável. Muito bonito.

John Lucas disse...

Muito bonito mesmo.
Por mais intensa que seja a poesia, por mais que a harmonia das notas seja praticamente perfeita, ainda assim é difícil definir amor.
Mas... estrelas brilham por anos luz certo?

Unknown disse...

Enquanto no mesmo verso existir o amor e o ódio, as rimas serão tristes e as estrofes finais melancólicas. Tente substituir o ódio pela indiferença, essa que mata e maltrata a alma. O vazio é inevitável, sempre existe. Mas se tirarmos o ódio, sentimento igualitário ao amor, a vida se torna mais aceitável e logo nos apresenta novos desejos, sejam eles carnais ou sentimentais.

Luciano disse...

Bela e empolgante narrativa. Gostei, ficou muito bom esse texto. Deixa um gostinho de quero mais.
Abração aí, tchê.

leila saads disse...

Há quanto tempo não guardo um comentário como o que você fez no meu blog com tanto carinho. Lindo mesmo, muito obrigada! A intensidade também mora nas suas palavras!
Gostei muito do texto, me lembrou um poeminha que eu fiz uns anos atrás: "É na ausência/ Que sinto teu amor/ Mais forte/ Mais acre/ Mais arisco/ Mais ácido/ Dói na alma/ Medo do fim/ Medo do só / Então me lembro/ Do que alguém/ Mais Lispector que eu/ Um dia se perguntou:/ "Será amor, então/ Entregar a própria solidão/ A outra pessoa?"

Um beijo grande=*

Paloma Pajarito disse...

concordei lá com o "H;". não que eu deseje que sempre escrevas sentindo "essas certas coisas" dentro de tu, mas, em textos assim que continuares escrevendo, que Caio Fernando te abençoe! hehe :P

carolina disse...

em escala decrescente. sinto uma intertextualidade e uma carência de amor romântico. we're at the same boat, fellow.

Luna disse...

eu poderia comentar, falar de um jeito bonito o que achei.poderia falar da melancolia que senti. mas acho que meu comentário é dispensável diante de palavras tão bem colocadas. Li duas vezes.

a verdade é que ando tão a flor da pele, que qualquer beijo de novela me faz chorar.


- Te amo, mas não conseguiria definir esse meu amor. Esquece o amor e me abraça? Mas não abraça meu corpo, e sim minh'alma.

...

Luciana Brito disse...

Nossa!

Lembrou-me Caio F. Abreu. Adorei e faltam comentários, só os sentidos bastam: indefinível.

"o pior do amar é o amar distante. te amo tanto quando estás longe que, ao te aproximares, meu amor não percorre, mas também não vira ódio: vira nada. vira falta de amor. vira vazio".


Ótimo.
Beijo.

Adriel disse...

Belo, trite, forte, com sentimento... o amor sem o toque, sem a presença, apenas ali o Amor, parado queto, esperando... a volta, e com mais força pois o querer não para, só aumenta, é o abraço.

Grande Abraço! otimo texto!

Dauri Batisti disse...

Os mistérios de amar carecem sempre de explicação. Vai entender!
Mas é assim, essa mstura, quem nos faz quem somos.

Um abraço.

Rubicreide disse...

me dá um abraço vai

Luian Damasceno disse...

"o pior do amar é o amar distante"
simplesmente lindo texto! muito rico! você conseguiu ao mesmo tempo ser suti e direto, sórdido e terno. Para poucos meu caro..