Sonhava uma e outra vez o mesmo sonho
no intuito de controlar o resto diurno,
de controlar o que acontecia, onírico,
e tapar a manifestação inconsciente do desejo.
Sonhava uma e outra vez entrecortado:
o sonho era sempre o mesmo, mas o sono
se dividia em pedaços, como uma grande pizza colocada
sobre o próprio limbo interno.
Sonhava mais uma vez até que uma voz de rugido veio quebrar o encanto:
o desfeitiço era como uma luz que estupra a escuridão e ingressa, sem licença,
por debaixo da porta.
A voz invadiu a sétima sonolência, estapeando a lentidão dos que dormem e colocando-o na realidade dura e doce
de se despertar com uma poesia falada.
"Te amo de uma maneira profunda, como quem ama o escuro e a sombra", ouviu.
E nesse mesmo instante seu corpo respondeu a prosa,
seus olhos atreveram-se a rasgar a falta de visão
e seus ouvidos voltaram a estar presentes. Sua mãe, como uma grande ninfa cor-de-rosa a altura de seus ombros,
ria-se da desconexão do discurso de uma parente.
"Hoje estou bem cachoeira, irei atrás de um cachorro..." dizia a prima.
Sonhava uma e outra vez o mesmo sonho.
Ou seria o amor,
que escuro e sombra e luz
vinha rir da sua cara?
Amar é como ir atrás de um cachorro.
E entregado como uma pena ao léu,
escondeu a cara entre as mãos
e amando
ensinou seus olhos
a dormir
mais uma e outra
vez.
F;
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